As designações dos nomes, acontecimentos, fatos em geral, estão intrinsecamente relacionados com a questão ideológica. Rajagopalan (2003) sobre seu texto “Designações” aponta para essa linha argumentativa e exemplifica utilizando a posição da mídia a partir de um viés político. Segundo ele o “papel da mídia tornou-se inconfundivelmente visível e inegável” (RAJAGOPALAN, 2003, p. 81) atualmente. Seus exemplos se caracterizam pela polaridade política Bem vs. Mal disseminadas pela a mídia: Iraque (figura do Osama Bin Laden como terrorista, e portanto, do Mal, perigoso, etc.) e EUA (figura do Bush como defensor da pátria e por “ser detentor da mídia” configura seus personagens). O texto ainda discursa sobre uma ilusória imparcialidade defendida pela mídia a cerca dos fatos. O não questionamento do público sobre as “realidades” relatadas sobre acontecimentos, pessoas, etc. Por sua vez o foco de seu texto, e seu livro Por uma lingüística crítica: linguagem, identidade e questão ética (2003), de modo mais amplo foca os discursos e consequências sobre “nomear”, “designar” determinado assunto e seus “personagens”. Existe uma forte tendência ideológica dentro dessa nomeação. Polaridades são construídas, pessoas são enaltecidas e odiadas. Isso se dá, também, pela massiva influência midiática na opinião pública. A ausência de grande parte da população em questionar esse(a) ou aquele(a) fato/pessoa resulta no condicionamento de verdade exclusiva, e assim, construção conceitual sem embasamento crítico. Assimilação de um olhar e apagamento de outros distintos. Devido a sua vinculação midiática ser forte ou fraca.
Nessa mesma linha podemos constatar as argumentações e contextualizar exemplos do Rajagopalan (2003) pelo que observamos atualmente na mídia sobre as designações dos manifestantes na Líbia, os “rebeldes”. Rebeldes por que se rebelaram contra o ditador Kadafi? Ou rebeldes por que simplesmente se voltaram contra o governo (independe ou não de ser uma ditadura ou democracia)?
Para nós, brasileiros, são rebeldes? Por que há uma invasão militar ocidental lutando contra as milícias do Kadafi ao lado dos “rebeldes”? Quais os reais interesses dessas intervenções? Por que o povo líbio se rebelou? Essas são questões que fervilham sob a pele da palavra “rebelde”.
A Líbia acompanha o mesmo processo revolucionário dos países árabes iniciado pelo Egito. Décadas de Ditaduras sendo postas em cheque pela mobilização popular e a instauração de um governo aparentemente democrático. Um processo que para nós, ocidentais, já se consolidou há anos. Entretanto, esquecemos, quando apontamos para o outro lado do mundo sem observar a cultura milenar daqueles países, os quais têm relação substancial com a religião. Eles lutam por um Estado laico, sem vínculo com a religião.
Os socialistas revolucionários apoiam o processo revolucionário dos países árabes, mas ressaltam que há duas guerras na Líbia: uma dentro do país (povo líbio vs. Ditador Kadafi) e outra internacional (Líbia vs. Invasão ocidental). Ambos são uma luta contra o imperialismo. Os interesses econômicos são maquiados pela bandeira da paz. É notório que o interesse da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan), liderada pelos Estados Unidos, França e Grã-Bretanha é continuar com as relações de exploração econômica no país árabe como Kadafi vinha mantendo desde 2003. E agora, com Kadafi em crise, tendo sua população se rebelando, os membros da Otan sentiram que se não tomassem uma posição teriam seus interesses comerciais ameaçados. Nesse sentido, voltaram suas armas contra aquele (Kadafi) que certa vez trocaram apertos de mãos calorosos e acordos comerciais vantajosos para ambos.
O termo rebelde se encaixa muito bem para a população líbia quando compreendemos esse contexto e quando sabemos que a mídia é controlada pela burguesia, a qual a financia. Desse modo, o ponto de vista dos controladores midiáticos fica absurdamente evidente nas denominações dos fatos. A imparcialidade é uma ilusão. A ideologia defendida é escancarada. Segundo Bakhtin (1929) “o signo é uma arena onde se travam as lutas de classes”, os valores em “rebeldes” estão lá se gladiando por um espaço, e o discurso “vencedor” têm se mostrado do lado midiático. O poder vinculador de informação se mostra, assim, a espada certeira do conflito ideológico.
Referências consultadas
ALMEIDA, Eduardo. Líbia: uma revolução, duas guerras. Opinião Socialista, no 420, p. 12-16, mar./abr. 2011.
BAKHTIN, Mikhail. Marxismo e filosofia da linguagem. Tradução de Michel Lahud e Yara Frateschi Vieira. São Paulo: Martins Fontes, 1997.
RAJAGOPALAN, Kanavillil. Por uma lingüística crítica: linguagem, identidade e questão ética. São Paulo: Parábola Editorial, 2003.
Intervenção da Otan na Líbia disponível em: <http://noticias.uol.com.br/ultimas-noticias/internacional/2011/04/04/otan-piorou-o-conflito-na-libia-dizem-rebeldes-qatar-enviara-armas-a-grupos-anti-gaddafi.jhtm>. Acesso em: 06 abr. 2011.